Tenho a garganta arranhada do fumo quente. A vista turvada pela sangria que arde. Sei que mais ninguém se importa. De hoje em diante acordarei todas as manhãs numa cama diferente e serão 365 ao todo. Farei o garrote bem apertado e deixarei que a colher fique branca por cima e negra por baixo, queimada ao calor da vela. Nada levarei comigo que me canse os ombros. Conhecerei o pôr-do-sol e a madrugada de mil cidades.
A minha mais recente conquista foi uma teoria: a inconstância destes tempos faz com que se morra muitas vezes. Morremos porque mudamos. Simples. Morrer é deixarmo-nos de nos ver. De nos ligar. Porque sim e não porque o pedíssemos. Advinha? Porque morremos. Já nem sequer me lembro de como foi o cortejo fúnebre nem se havia convidados. Morri e espero calmamente. Incubo a frio uma nova visão sobre o mundo, um novo ponto de vista, um ideal diferente do que morreu. Porque o mataram? Porque o cegaram.
Guardo todo este carinho (nunca pensaste que o pensamento chegasse a esta estrada deserta, confessa) e toda esta vontade de partilhar para quem (não existe) me diga que não quer nada em troca. Que me quer apenas saber vivo para que seu coração bata. E aí darei, esbanjarei tudo o que me restar e saberei onde dorme o sol nas noite frias de luar.
Até lá, juro e jurarei beber da minha liberdade e viverei 100 anos para me ver cair. Renunciarei à roda livre dos sentimentos (em que se mudam cheiros e braços mas não as falsas palavras). Tornarei a rotina dos dias redundante. Procurarei o brilho no olhar, não o objectivo a alcançar. Estranho ser este, que perguiça por abrir as asas em aerodinâmica louca e prefere o ninho de pauzinhos, certo, amante, acorrentado.
Serão 365 as noites. 365 os dias. Tenho fé (não em deus, for god's sake) que a força que me percorre as veias não mais se apagará. Não haverá rescaldo. Só mortes intermédias, inevitáveis como teoricamente previ...